- Author, Anagha Pathak
- Role, BBC News Marati
Mesmo quando não enfrentam os escaldantes meses de verão ou invernos congelantes, elas percorrem quilômetros a pé todos os dias, com baldes nas mãos e equilibrando vasilhames de barro ou plástico sobre a cabeça, para manter o estoque de água da casa.
“É uma luta diária. Fico tão cansada que desmaio quando termino”, conta Sunita Bhurbade. Ela mora na aldeia de Tringalwadi, que fica a 180 km do centro financeiro da Índia, a cidade de Mumbai.
Bhurbade leva quatro a cinco horas para ir até a sua fonte de água confiável mais próxima (um lago seco), encher os potes e voltar, todos os dias.
A água é suja. Ela precisa cavar buracos ao lado dos recipientes, para servir de filtro natural antes que a água entre nos potes.
“Por quatro a cinco meses, todos os anos, as mulheres não têm opção a não ser percorrer longas distâncias para ir buscar água, já que os poços e as fontes de água mais próximas ficam secos”, ela conta.
Ironicamente, sua aldeia recebe algumas das chuvas mais pesadas da região.
O rigor da sua vida diária faz com que ela se queixe constantemente de dores nas costas e no pescoço, fadiga e fraqueza – e também impede que ela e outras mulheres da aldeia procurem empregos remunerados.
“Ninguém irá me contratar, nem mesmo para trabalhar nas fazendas, porque eles não irão me permitir chegar ao trabalho à tarde”, ela conta. “Se eu for buscar água, preciso sacrificar meu sustento. Se for ganhar um salário, minha família fica com sede.”
Um relatório da Organização Mundial da Saúde (OMS) e da Unicef, publicado em 2023, indica que 1,8 bilhão de pessoas em todo o mundo coletam água potável de fontes distantes. E, em sete a cada dez residências, as mulheres e meninas são as principais responsáveis pela coleta da água.
Essa situação ocorre particularmente na Índia, onde a necessidade de garantir água potável prejudica as mulheres e dificulta o crescimento econômico, segundo os especialistas.
“Primeiramente, as mulheres não conseguem trabalho remunerado porque precisam fazer todas as tarefas domésticas”, afirma a professora Ashwini Deshpande, chefe do departamento de economia da Universidade Ashoka na capital indiana, Nova Déli.
“E, em segundo lugar, mesmo se quisessem encontrar trabalho após os afazeres diários, não existem empregos remunerados suficientes para as mulheres na zona rural da Índia”, explica ela.
O trabalho não remunerado das mulheres na economia indiana tem imenso valor.
O relatório Ecowrap – publicado pelo maior banco comercial do país, o State Bank of India (SBI) – indica que a contribuição total do trabalho não remunerado das mulheres para a economia indiana é de cerca de 22,7 trilhões de rúpias (US$ 276,8 bilhões, ou cerca de R$ 1,5 trilhão). O valor representa cerca de 7,5% do PIB total da Índia.
O governo indiano afirma que está trabalhando constantemente para melhorar a infraestrutura de água em todo o país. Em janeiro de 2024, o governo declarou que quase 74% das residências na zona rural contam com água encanada.
Essa experiência mudou a vida das pessoas que precisavam ir buscar água em locais distantes e, agora, recebem água encanada nas suas casas.
“Eu abro a torneira e sai água… é como um sonho. Eu saía para buscar água desde os cinco anos de idade”, conta Mangal Khadke. Hoje na casa dos 30 anos, ela é casada e mora a cerca de 30 km de Sunita Bhurbade.
Mas ainda existem milhões de pessoas que não têm acesso à água encanada.
A chefe da aldeia de Aaki, Indrayani Javarkar, passa a maior parte do dia procurando e recolhendo água. A aldeia fica a cerca de 700 km de distância de Tringalwadi, no distrito de Amaravati (região central da Índia).
“Fica tão seco aqui no verão que, todos os dias, acordo com um pensamento na cabeça: onde posso encontrar água hoje?”, ela conta.
Indrayani tem dois empregos. Primeiro, ela procura e coleta água para sua família. Depois, ela organiza as cisternas para sua aldeia.
“As duas tarefas estão ficando mais difíceis a cada dia”, segundo ela. Mas Bhurbade conta que, para ela, ter água encanada ainda é um sonho distante.
“[As mulheres] começam quando são crianças”, ela conta. “Alguém entrega a elas um pequeno balde e diz, ‘vá buscar o que puder carregar’. Depois, aquilo se torna uma obrigação para toda a vida – até morrer, ela irá buscar água.”
Bhurbade não se lembra de um único ano em que ela não precisasse andar quilômetros com um pote na cabeça.
Perguntamos o que ela faria se não precisasse pegar água e tivesse esse tempo livre. Ela pensa bastante e responde que gosta de cantar. Mas suas canções também falam sobre a água.
“Radu nako bala mi panyala jate“, canta ela. Significa “não chore, meu filho, estou indo buscar água”.